Encontro da Rede IUFI: “Contribuições para formação e pesquisa na Universidade a partir da Orientação Lacaniana: como a psicanálise contribui para o ensino e a pesquisa na Universidade?

Encontro da Rede IUFI: “Contribuições para formação e pesquisa na Universidade a partir da Orientação Lacaniana: como a psicanálise contribui para o ensino e a pesquisa na Universidade?

Paula Husni. EOL- AMP “De plantas, flores y otras hierbas” I. Fotografía.

Paula Husni. EOL- AMP “De plantas, flores e outras ervas.” I. Fotografia.

María Victoria Clavijo NEL- AMP

O primeiro encontro da rede IUFI foi realizado na EOL em 13 de setembro de 2017. Organizado em duas mesas, foram apresentados trabalhos livres de cartelizantes na primeira, e trabalhos da Rede na segunda. As mesas foram coordenadas por Gastón Cottino (Arg.) e Nohemí Brown (Br.).

O primeiro trabalho, de Leonardo Rodríguez (Arg), parte da experiência docente na Faculdade de Filosofia da Universidade de San Juan e desenvolve a seguinte questão: como é possível introduzir o discurso analítico na prática universitária? O discurso universitário formulado por Lacan não adquire tal natureza por situar-se na Universidade, mas opera no momento em que o saber ocupa o lugar dominante no discurso como um saber absoluto, é o que na linguagem corrente se denomina “burocracia”. O discurso universitário é “o mesmo discurso do amo fortalecido pela ignorância”, de tal modo que “quanto mais se sabe, quanto mais se conhece, mais ignorantes nos tornamos para nós mesmos”. Sustentar o ensino de Lacan implicaria não ceder ao real em jogo, isto é, indicar que o sujeito pode ser capaz de preservar o enigma do saber.

Guilhermina Laferrara se apoia em Jacques-Alain Miller, em sua apresentação do X Congresso da AMP, quando indica que analisar o parlêtre é uma prática que já está sendo feita, e o que ainda falta é saber dizer. Da mesma forma, pode-se dizer que a psicanálise na Universidade é um fato, mas fica pendente o saber dizer. Uma via possível frente ao impossível de ensinar, na universidade se situaria na pesquisa sobre o “saber ler” e o “bem dizer” articulado ao que Lacan denomina “desejo do professor”. Embora sejam próprias do analista, seria possível conceber essas propriedades para o professor? Vale ressaltar um trecho em que Lacan afirma: “Que alguém possa colocar a questão do desejo do professor é um sinal de que existe um ensino (…). Ali onde o problema não se coloca é que existe um professor “(Lacan, Sem 10). Como conclusão de seu trabalho, a autora afirma: “falar da psicanálise na Universidade é uma oferta que o professor faz a partir do seu próprio desejo e que, longe de tamponar o impossível de dizer, lhe faz um lugar”.

De sua parte, Nancy Greca Carneiro (Br) pretende responder a pergunta: o que faz um psicanalista na Universidade? Foram Lacan e Miller que introduziram instrumentos universitários em sua Escola pelas vias da pesquisa no marco de mestrados e doutorados e com Miller, a formação do analista se estende ao Instituto do Campo Freudiano. Conta como o seu amor pela psicanálise nasce na Universidade, e o desejo de Escola surge quando ele pôde enunciar: “Venho para a escola, não pela via do saber, mas sim por uma verdade semi-dita”. No Brasil, não se tem constado que o fato de que se ensine a psicanálise dentro do currículo da psicologia, que isso leve à absorção da psicanálise pela psicologia, apesar de que haja um risco permanente como alerta Jacques-Alain Miller em várias ocasiões (Banquete dos analistas, Psicanálise pura, psicanálise aplicada versus psicoterapia). Tanto na Escola como nos institutos, se aponta para uma transformação do saber suposto ao saber exposto; a Escola com o passe e os Institutos em sua vertente de pesquisa clínica, a fim de evitar a alta absorção da psicanálise no saber suposto. A universidade não seria apenas o lugar de seleção, mas de formação, uma vez que “a demanda de saber se responde com o amor de transferência, a transferência à psicanálise que faz aparecer como aposta, o desejo de saber”.

Por outro lado, Flávia Cêra (Br) pergunta como introduzir a leitura de Lacan na Universidade, já que no discurso universitário a leitura tenta obter um acúmulo de saber e os pontos de conflito são tomados como impotência ou como um mal-entendido que deve ser suturado, quando no discurso analítico, a leitura é um procedimento de perda que encontra sua estrutura justamente no mal-entendido. É o próprio Lacan que aprofunda a perspectiva de que a leitura não é garantia de compreensão, como encontramos na contracapa dos Outros escritos: “A-NÃO-SE-LER”.

A segunda mesa abordou a questão da pesquisa na Universidade.

Héctor Gallo (Col) apresenta como se desenvolve uma experiência de formação clínica de psicólogos que fazem atendimento psicológico no âmbito universitário no Departamento de desenvolvimento estudantil. Surgem perguntas tais como: que clínica é possível em um contexto institucional educativo? Um princípio orienta este trabalho: para além dos protocolos e a exigência de ajustar-se aos padrões da instituição, se trata de assumir a responsabilidade pela formação clínica, que é sustentada pela ética do desejo.

David Albano (Cba) apresenta um texto produto de um cartel sobre “Pesquisa em psicanálise na Universidade”, a partir do qual se desenha uma perspectiva interessante sobre a pesquisa, que difere da leitura ou estudo da psicanálise; a pesquisa consistiria em “furar S1 no lugar do agente, furá-lo e encorajar-se para que saia algo fora do tedioso copy and paste”. A especificidade da psicanálise, como provém de uma experiência singular, marca também o que deveria ser tomado como orientação na pesquisa, a saber, que a pesquisa em psicanálise vincularia clínica, política e episteme. Dois obstáculos à pesquisa em psicanálise: a adaptação da pesquisa psicanalítica na linguagem que a ciência exige, e a falta de legitimidade da psicanálise, devido à escassa presença de psicanalistas nas instâncias de avaliação das Universidades.

Gerardo Arenas (Arg) parte de uma premissa: “se pesquisa pouco em psicanálise”, e estabelece três pistas de pesquisa, que buscam limitar o risco envolvido na pesquisa em psicanálise, a saber, “ser absorvida pelo discurso universitário” o que pode ocorrer pela tensão entre dois laços: o analítico e o universitário. A primeira pista: incluir na pesquisa, as razões porque se investiga, caso contrário, o que se investiga seria “objetivo”, separado do próprio sujeito. A segunda, evitar a avaliação e com isso o uso de estatísticas, o instrumento do novo mestre que se alinha com o saber para fazê-la passar por ciência. Não é preciso dizer que a psicanálise não é ciência nem pretende ser, pois toma como sua razão de ser justamente o que é rechaçado pela ciência: o sujeito e o que o faz singular. A terceira pista: ao pesquisar, não perder de vista a relação que os conceitos têm com os problemas clínicos que estão em sua base.

Tradução: Jussara Jovita Souza da Rosa

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