
Mónica Biaggio. “Aire”. Aguada. EOL- AMP
OBSERVATÓRIO FAPOL 1
Jorge Chamorro
EOL-AMP
Ideologia ou lógica:
A lógica psicanalítica interroga as categorias gerais presentes na ideologia que subjaz à violência de gênero e que tem suas origens no movimento feminista. Contraponto entre uma lógica que tende à captação da singularidade e à ideologia que ao sustentar-se em categorias gerais, encobre toda singularidade.
A legislação orientada por esta ideologia arrasta as mesmas fragilidades, preconceitos e desconhecimentos. Acomoda a problemática no homem e converte a mulher em vítima natural de um delito provocado por ele.
A vítima: o preconceito constrói o juízo
Este lugar é ocupado pelas mulheres. É o resultado de diversos condicionamentos.
Se partirmos do pré-conceito: “há violência contra as mulheres”, não há nenhuma dúvida que haverá. Recortando este fenômeno e destacando-o, este fato prevalecerá sobre outros. Além do mais se construímos dispositivos e leis que respondam ao mesmo, teremos construído um real que não estava na realidade.
A psicanálise interroga a vítima enquanto sujeito responsável.
Esta formulação se distancia totalmente daquela que diz: “algo terá feito”.
Entende-se como sujeito responsável, a implicação subjetiva, de desejo e de gozo de cada um. As figuras do feminino deverão dar conta de sua articulação com a situação de vítima. Não há dúvida de que a mulher tenha sido vítima do discurso predominante dos homens. Hipócrates, Aristóteles, os homens de igreja, Schopenhauer entre outros.
A questão essencial é como sair deste lugar; seguramente não é pela porta de desconhecer as particularidades do feminino.
O vitimador: homem violento
É uma categoria que identifica o ser do homem e a violência, anulando as drásticas diferenças entre o ato e o ser. Passagem ao ato não define o ser, mas a ideologia os unifica e desta unificação emerge uma condena acéfala que não calcula circunstâncias, não distingue patologias. Por exemplo, psicoses paranoicas, sempre dispostas à violência de gênero e as outras.
As legislações e os dispositivos condenam o homem a priori como violento, o segregam e o excluem. A capacidade criativa destas categorias é uma verdadeira ameaça: “és violento”. Sob esta categoria se encontra de tudo, inclusive pais que pretendem exercer sua função. Quer dizer: “que se irritam”.
No espaço do homem violento entra um homem impotente, um esquizofrênico que mata a cinco mulheres, um homem que empurra sua mulher, que fecha a porta com chave e não a deixa sair, um paranoico que supõe que sua mulher faz coisas às escondidas, mas também um sujeito em análise que interroga seu ato e se implica nele.
O especialista em violência de gênero: Um sujeito do universal
É um sujeito envolvido nas ideologias mencionadas que conta com leis e dispositivos que o acompanham. Disposto a desconhecer particularidades, paira sobre homens muito diferentes, a categoria: “violento”. Vitimador a partir da lei ou vítima dos dispositivos? Isto não é só um exercício de nominação. Traz consequências: proibição de contatar os filhos, distância com a mulher, ressarcimentos econômicos.
Ao mesmo tempo a categoria vítima, desresponsabiliza a mulher e a apresenta como a “reivindicadora”, que é o nome do esmagamento do feminino.
A lógica do psicanalista e suas consequências:
Escutar a cada sujeito sem preconceitos permitirá ao psicanalista:
-separar à mulher e o homem dos universais;
-separar o ato do ser;
-interrogar os sintomas que produzem os dispositivos de proteção à vítima;
-evitar o desencadeamento de protocolos que, sobre o fundo de denúncias, às vezes inconsistentes, avançam sobre a realidade dos fatos;
-trabalhar no levantamento da qualificação do ato violento como delito.
Trata-se de um preconceito que condena sem julgar, o qual é uma verdadeira exceção à ordem jurídica.
-revelar que por trás da problemática em questão, há uma condena e sanção que castiga à prostituição sob o amparo de proteção à vítima.
Concluímos que a lógica da psicanálise (com sua consequente ética e política) é fundamental para encarar o problema atual da violência de gênero.